quarta-feira, 16 de outubro de 2013

Partido da Educação


Nunca fui, não sou e nunca serei militante do PT, PSDB, PV, PSOL, PMDB e PQPs afins. Ao meu ver, os únicos partidos que realmente trabalham por ideologias são radicais demais, tanto para a esquerda como para a direita. Para o resto todo, o importante é ganhar cargos, dinheiro e crescer para ter acesso ao fundo partidário. 

Diante desse indigesto caldo político que engloba nada menos do que 32 partidos, é lamentável, rasa, simplista, inocente, ingênua e maniqueísta a opinião sobre política que descamba para a malhação de um ou outro partido. Vejo muitas pessoas que insistem em satanizar alguma agremiação, como se todas as demais fossem superiores. 

No Brasil, poucos partidos compartilham o poder. A maior parte dos estados (8) está com o PSDB, já a maior parte das prefeituras está com o PT (27). Logo abaixo nesse ranking estão PSB, PMDB, PSD e PDT. Quem se arrisca a dizer que algum desses governos é automaticamente mais honesto e/ou melhor que outro só pela sigla? Dar uma opinião assim é ignorar completamente o bolo fecal que é necessário formar para que haja um governo. 

Alianças, frentes, acordos, negociações, favorecimentos, vista grossa, vista fina, tudo isso é necessário para qualquer governo subsistir minimamente. Triste, mas real. O risco de não se conformar com o “stablishment” é o isolamento. 

Sair dizendo que o PSDB é uma quadrilha, ou que o PT é uma corja, taxar qualquer partido como a principal desgraça do País, é negar os vícios da corrupção portuguesa herdados desde os tempos da Colônia. Fomos criados, formados e alicerçados numa cultura de exploração e vantagem, e até hoje somos assim. Atire a primeira pedra o brasileiro que nunca, na vida, fez alguma coisa “errada” para se dar bem. O Brasil vive escândalos de corrupção desde sempre. A História taí pra nos provar: Globo/Time Life, Ferrovia do Aço, Projeto Jaíba, Caso Luftfalla, Transamazônica, Proconsult, Coroa-Brastel, Fórum TRT, Máfia dos Fiscais, Sudam, Anões do Orçamento, Vampiros da Saúde, e assim ad eternum. Isso tudo envolve centenas de políticos e partidos diferentes, de todos os tipos.

Como disse, não sou a favor de nenhum partido específico. Sou a favor de gestão democrática e esforço para melhorar o país. Mas, é ridículo ouvir, quando querem falar mal do PT por exemplo, que os programas sociais são assistencialistas e atrasam o desenvolvimento. Isso é papo de quem não sabe como funciona o programa e, pior, não está na pele de quem realmente precisa. 

O engraçado é que o Fome Zero (do “analfabeto” Lula) apenas unificou (com o esforço da Dona Ruth Cardoso) o Bolsa Escola, Bolsa Alimentação, Cartão Alimentação e o Auxílio Gás, todos criados pelo Fernando Henrique Cardoso (PSDB). E aí? Podem começar a xingar nosso sociólogo catedrático e honoris-causa FHC.

Aliás, o Bolsa Família é tão ruim, tão falho e demagogo, que acabou de ganhar o prêmio Nobel da seguridade social, o
Award for Outstanding Achievement in Social Security, concedido pela Associação Internacional de Seguridade Social, com sede na Suíça. É uma entidade reconhecida por 157 países e 330 organizações não governamentais. Disseram que o Bolsa Família é uma “experiência excepcional e pioneira na redução da pobreza”. Mas eles não entendem de nada, devem estar errados, né?

Também vi muita gente falando que o STF foi comprado pelo PT para não condenar os envolvidos no Mensalão. Pelo jeito o dinheiro caiu em mãos erradas, afinal, são onze ministros, oito indicados por Lula e Dilma, e toda a antiga cúpula do PT está sendo condenada. Devem ser oito ingratos... 

Mais estranho ainda é lembrar que, durante o governo FHC, houve o pioneiro mensalão na campanha para a eleição de Eduardo Azeredo, um dos fundadores e presidente do PSDB em 1998, e que já funcionava com Marcos Valério na confusão. Sem falar na compra de votos para reeleição de FHC. O julgamento está no STF, e até hoje pouco andou. Se o STF foi comprado, o PSDB deve ter pago mais. No frigir dos ovos, o que estraga o Brasil é a falta de investimento em educação, e quanto a isso nem FHC nem Lula fizeram o que tinha que ser feito: valorizar o professor e as condições de educação. Quando isso acontecer, é uma questão de tempo para que tudo entre nos eixos e a população terá ferramentas para compreender o que e quem é melhor pro Brasil.

sexta-feira, 11 de outubro de 2013

Era proibido proibir

Caetano e Gil acharam liberdade fora do Brasil
Dizem que "Ou a gente passa o tempo, ou o tempo passa a gente". Para alguns ícones de nossa cultura, o tempo não passou por eles. O tempo atropelou, deu ré, passou de novo, e foi embora esmagando o que restou. No caso, não foram atropelados seus corpos que, na maioria, estão na sétima década de vida, mas sim suas consciências, que um dia cunharam clássicos como "Eu digo não ao não" e "Afasta de mim esse cálice". 

Pois é. Caetano Veloso, Gilberto Gil, Chico Buarque, Djavan, Erasmo Carlos, Roberto Carlos, Milton Nascimento já foram jovens artistas, intrépidos, ousados, revolucionários. Agora são parte de um grupo ironicamente chamado de "Procure Saber", e lutam para que biografias não autorizadas não possam ser vendidas. 

Todos esses figurões iniciaram suas carreiras numa época em que tudo o que se queira era "procurar saber", mas não se podia. Livros, filmes, artigos, peças, músicas, reportagens, tudo era censurado e o povo só tinha a informação oficial para se contentar. Graças ao sacrifício de muita gente, esses tempos ficaram pra trás. Hoje a censura existe, só que mais suave e sutil. Julgamos ter a liberdade de encontrar informações que mostram o outro lado da moeda, de qualquer coisa ou qualquer um. E isso é bom, nos permite novos olhares sobre as coisas. 
Biografias não autorizadas geralmente são as melhores

Por exemplo: seria triste lermos uma biografia de Che Guevara que mostrasse sua preocupação social, sua inteligência, carisma, boas intenções, mas não revelasse sua participação em tribunais de execução ou suas opiniões alicerçadas na base da violência. Como seria chato ler sobre Fernando Henrique Cardoso, conhecer seu perfil estadista, a habilidade política, seu casamento feliz com a Dona Ruth, e não sabermos que ele tem um filho com uma ex-jornalista da Globo e que mora com a mãe na Europa. 

Coisas assim, só sabemos porque ainda se pode escrever sobre isso, falando de histórias de alcova que os biografados não gostariam que viessem à tona. Mas, para os medalhões da MPB, isso agora tem que ser proibido. O problema é que isso é censura, obscurantismo. Além disso, não há nada mais chato e inútil do que ler a história de alguém do jeito que esse alguém quer que ela seja, com deslizes calculados, sucessos aumentados, escândalos encobertos, enfim, um panfleto chapa-branca. 


O que aconteceu com a cabeça desses artistas? O que mudou nos princípios defendidos nos anos 60? A resposta é simples e triste: dinheiro. Naquela época ainda não eram ricos. Hoje são, mas querem mais. É isso que move o interesse deles em proibir essas biografias. Paula Lavigne, ex-mulher de Caê e porta-voz da associação diz: "pessoas públicas também têm direito à intimidade e vida privada". Concordo. Mas, depois ela fala o que interessa pra eles: "se alguém quiser escrever uma biografia e publicá-la na internet sem cobrar, tudo bem. O problema é lucrar com isso". Que coisa não? A vida exposta de graça não ofende a intimidade do artista, mas se cobrar ofende? Pelo jeito, só ofende porque não pinga na conta deles também. 

Djavan chegou a dizer: "editores e biógrafos 
ganham fortunas enquanto aos biografados resta o ônus do sofrimento e indignação". Talvez Djavan não saiba, mas biógrafos geralmente são jornalistas que pesquisam por anos e anos, entrevistando dezenas de pessoas, levantando arquivos antigos, investigando entrevistas já realizadas, revistas, jornais, filmes e tudo que diga respeito ao biografado. É um esforço desgastante. Editoras são empresas que precisam se manter vivas num mercado acirrado, em um país em que quase 50% das empresas fecham após três anos. Logo, é claro que eles ganham dinheiro com isso. Alguém trabalha, alguém paga, alguém compra. Se o biografado não gosta do que dizem, processe por dano moral! A Lei pra isso já existe. 

Paula Lavigne adoraria ter nascido em outra época

“Vamos correr o risco de estimular biografias sensacionalistas”, disse Paula Lavigne. Só que esse é o melhor risco, típico de democracias. "Ninguém pede para ler antes o que é publicado em jornais", lembrou Sônia Jardim, presidente do Sindicato Nacional dos Editores de Livros. E jornais são vendidos, inclusive os sensacionalistas. 

O que dói em nossas almas é ver os heróis da MPB, sujeitos discutidos e biografados, outrora perseguidos e presos por causa de sua expressão de liberdade, agora querendo censurar a liberdade dos outros. E não pela honra, mas por dinheiro. Uma postura que mistura o totalitarismo de Stalin com o capitalismo selvagem de Murdoch: o pior dos mundos. Sempre achei burrice gente que nasce, cresce, reproduz e morre, tendo exatamente as mesmas opiniões sobre tudo. 


Mudar de ideia, muitas vezes, é sinal de maturidade e humildade. Mas, corromper princípios, no caso a liberdade de informação e expressão, não é saudável nem inteligente. Tenho esperança de que esse chilique ditatorial mercantilista, reacionário, mal disfarçado de resguardo pela moral e ética, querendo inibir a sociedade, dê com a cara na porta da Constituição, que garante a liberdade de trabalho dos biógrafos e editores. Afinal, Chico, Caetano e companhia: “apesar de vocês, amanhã há de ser outro dia, la laiá la laiá”.


quarta-feira, 2 de outubro de 2013

Ainda precisamos de guitar heros

Quase invisível na mídia nacional, Mayer lotou o Anhembi
"Grupos com guitarras estão saindo de moda". Com essa profecia digna de Mãe Dinah, um executivo de gravadora recusou contratar uma banda estreante nos anos 60. No caso, eram uns moleques que se chamavam de Beatles.

Do mesmo jeito que a maior banda pop da história chegou a ser preterida pelo som do momento (na época o soul da Motown bombava), inúmeros casos semelhantes acontecem todos os dias. E o principal motivo? O mercado diz para as pessoas do que elas devem gostar. Triste, é constatar que muita gente acaba mesmo gostando do que lhes enfiam goela abaixo. 

Em 19 de setembro, cerca de 60 mil pessoas se apertaram para assistir John Mayer, na Arena Anhembi, em São Paulo. São 60 mil brasileiros, em sua maioria jovens, que pagaram preços consideráveis para assistir ao primeiro show no Brasil de um músico que toca exatamente o que não é moda nessas terras: "músicas com guitarras". Aqui, o sentido não é a guitarra em si, mas seu protagonismo na música. O Brasil é rico em cultura musical, estilos, formas, e já produziu coisas como Chico Science e Nação Zumbi, Novos Baianos, Sepultura, Marisa Monte, Yamandú Costa, Só Pra Contrariar, entre outras pérolas de linguagens totalmente distintas.
Esses são os grandes expoentes da música nacional hoje

Mas, para os efeitos do estrelato, só existem porcarias. A mídia cultural, estimulada ($) pelas gravadoras, só divulga Michel Teló, Ivete Sangalo (ainda), Naldo, Anitta e a turma do Quadradinho de Oito. Esses são alguns ícones atuais da "música/mídia brasileira", e representam o que há de "melhor" no sertanejo, axé, funk e afins. Alguns já estão milionários, bem como suas gravadoras. 

Gosto é gosto, e cada um tem o seu. O problema aparece quando gostar desses tipos, muitas vezes (sempre há exceções), é apenas preguiça mental e falta de personalidade, sujeita às vontades da televisão e do rádio. Gostam porque todo mundo gosta, porque toca na balada, porque apareceu no Fantástico, porque a letra é animada: "Eu meto tudo, eu pego firme pra valer".

Guitarra de Mayer entrega quem é seu ídolo

Num ambiente cultural em que essas coisas fazem um baita sucesso, imagine a resposta de uma gravadora no Brasil que seria dada a um músico que toca rock/pop/blues/romântico com letras pessoais e grandes doses de guitarra para uma gravadora aqui? Provavelmente dirão "Grupos com guitarras estão saindo de moda. O negócio agora é dupla sertaneja e blá blá blá". Nada contra esses caras. Como disse antes, gosto é gosto. Mas, quando não sobra espaço para opções, aí sim sou contra.  

No Brasil, negariam um contrato a John Mayer, que faz sucesso suficiente no mundo pra juntar aquelas 60 mil pessoas, que o descobriram apesar da campanha na TV para conhecermos o novo sucesso do Restart (esse durou pouco mesmo...). Mayer também foi escalado para o Rock in Rio, expondo-se ao grande público. Mas seu show não tem dançarinas seminuas, coreografias, não manda tirar o pé do chão, e o absurdo total: ele se deixa levar por sua excelente banda, ficar solto rumo a solos que misturam fúria e sensibilidade, evocando Eric Clapton, Jimi Hendrix e Stevie Ray Vaughan.

Hendrix em 1967, e a guitarra que inspirou a de Mayer

O público, formado por brasileiros, dentre os quais muitos que também pulam ao som de Naldo e companhia, se empolgou! Provaram que só não consomem mais esse tipo de música porque ela simplesmente não aparece, porque no Brasil só é bom se passar na Globo, se o Neymar dançar durante um jogo, se aparecer no Criança Esperança, se fizer dueto com Caetano Veloso. Fato é que as mulheres saíram querendo casar com o guitarrista, e os homens querendo tocar e cantar como ele. 

John Mayer homenageou Tom Jobim em suas melodias e também citou Hendrix, de quem ele não arranha a superfície, mas absorveu a atitude. Isso não está nas fórmulas do sucesso fonográfico brasileiro. Mayer nunca seria conhecido no mundo se tivesse nascido aqui. Teria que viver de trocados, tocando no limitado circuito de bares que valorizam esse som, ou tentar a sorte lá fora. Talvez seja prematuro considerá-lo um "guitar hero", mas, se ele arrebanhou 60 mil no Anhembi, num Brasil mergulhado em porcarias musicais, e sem aparecer antes no Fantástico, certamente já assegurou seu lugar de honra entre o público que gosta de talento, mais do que de marketing.